Imprescindível a leitura
07 de abril de 1957, coluna Literatura, em A Tribuna, com o pseudônimo de Mara Lobo
Verdadeiramente, é hoje que começamos. A primeira crônica desta seção é a que inserimos nestas linhas, dirigidas aos que virão a ser os nossos leitores e cooperadores, porque esta seção não visa senão estabelecer ligações em grande número com aqueles leitores que desejem saber de literatura. Importa isto que responderemos a consultas de nossos leitores sobre literatura: qualquer que seja a sua indagação nós estamos habilitados a fornecer uma resposta. Esta a primeira condição de um serviço de literatura, o que esta seção deseja ser. Autores, livros, nacionais e estrangeiros, de ontem e de hoje, do passado e do presente, aqui nos dispomos a atender consultas sobre literatura…
Importa isto, porém, já o sabermos, em que haja interessados em literatura. Literatura é tudo aquilo a que servem os que cuidam, aprimoradamente, de trabalhos em que a palavra é a matéria-prima, matéria-prima que deve ser manejada com todas as suas qualidades inerentes a uma semântica e, logicamente, a uma ou a várias consequências. Literatura, portanto, belas letras como se tornam, são a pura ficção ou a ficção em qualquer grau – e será conto, novela, romance; refinando-se o apólogo, buscando-se a essência profunda dos imponderáveis humanos a comunicar, buscando formas mais cultivadas ainda do que a prosa, que é linearmente horizontal, o poema visivelmente se torna coluna, acumula linhas numa ordem vertical que fura o espaço branco do papel e se aprofunda para dentro das sensibilidades e dos temas – vê-se na ordem do verso a música feita de palavras, a evocação, pelas palavras, de uma porção de efeitos, com uma causa oculta que o poeta traz à tona, e que é, primeiro, poesia…
Há na história da prosa e do verso, ao longo da civilização humana, uma porção de classificações. Os especialistas as conhecem. Mas não é preciso especializar-se em literatura para conhecer as boas obras literárias, os bons autores. Naturalmente, há pessoas com mais gosto por livros do que outras. Percorrem as notícias e as críticas e se informam. No entanto, o que importa, no momento, amigos, para nós todos, é MANTER E CULTIVAR O GOSTO DA LEITURA.
Nosso mundo do século XX descobriu o cinema, que ampliou suas dimensões da primeira tela negra, e a arte, de muda passou a sonora e falada, e de branca e negra passou a colorida… Depois veio o rádio. Chegou agora a televisão que combina rádio e cinema. A letra vai perdendo terreno – porque entre romance e conto e o cinema, criaram-se “historietas em quadrinhos”. Não que fosse uma novidade – a primeira história em quadrinhos tem mais de 400 anos. Mas o gênero se tornou intensamente utilizado.
Em detrimento da leitura, da leitura do livro, romance e poema. Acossado pelo cinema, pelo rádio, pela televisão, pela história de quadrinhos – o livro resiste à dura concorrência, num esforço que precisamos reforçar. A pedagogia não encontrou ainda melhor veículo para a cultura humana. Cinema, rádio, televisão, história em quadrinhos, didaticamente utilizadas, nunca passarão de AUXILIARES da cultura.
Pois todos eles reproduzem “apenas” o que a letra estabelece entre o momento da criação e a tarefa realizada do escritor e do poeta. Escritores, e poetas são, pois, os decisivos intermediários da produção literária, em livros – não são “substituídos” por locutores de rádio, por atores de cinema ou de televisão.
É, portanto, ao livro que nos reportamos. É preciso ler livros, ter livros, procurar livros, trocar livros, emprestar livros – reciprocamente como medida econômica, mas é uma necessidade devolver um livro emprestado… Sim, é uma tarefa que precisa do cuidado de todos nós a disseminação da leitura. O que não impedirá ir ao cinema, ouvir rádio, ver-ouvir televisão.
Por que temos um rádio, uma televisão, e não temos uma estante de livros em casa?
A tarefa essencial de uma cidade que cultua a inteligência, de uma cidade que aspira a uma posição, é a de MANTER E CULTIVAR O GOSTO PELA LEITURA.
A serviço dessa diretriz colocamo-nos aqui, agora e sempre, pela leitura e para a leitura.
MARA LOBO