O Jornalismo de Pagu

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As Caveiras e a Questão Econômica

A máquina da Light espalha a população da Av. Central atravessando em etapas de sinais a grande rua. Penetra nos boulevards elegantes. Faz ponto no cemitério de classe, onde os esqueletos ricos, esparramando átomos, continuam a sua vida cientificamente nos fenômemos químicos da decomposição. O conhecido cemitério de São João Batista. Conhecido ao menos no único dia que o mundo cristão concede aos mortos, ciente de que nos outros eles só vivem no purgatório, fornecendo com a ilusão salvadora das missas a realidade da economia sacerdotal.

Os túmulos desfilam arrumados e simétricos. Feudais imponentes nas armas velhas do Império. Ou nas cores em granito moderno da burguesia avançada. Todos em fila se esparramando pelo terreno monopolizando lugar, na concorrência das enormidades artísticas ou dos esplêndidos isolamentos.

Os túmulos da família.

Às três horas da tarde só no silêncio dos ciprestes adubados. O trabalhador municipal, o guarda-coveiro faz a limpeza saltando lépido. Carrega flores murchas, só se volta e deixa de assobiar a uma interrogação.

-É o túmulo do Barão de Peruíbe. Posso mostrar. Faça o favor… cuidado aí com esse monte… Está um cheiro dos diabos.

Gosta de falar. Desforra-se do silêncio obrigatório que tem entre sepulturas.

O túmulo do barão domina em grandiosidade os outros vizinhos.

-É o Banco do Brasil da Baronesa. Ela mandou fazer para enterrar o marido quando andava cheia da nota. Agora quando se aperta vende um pedacinho do terreno. Este túmulo aqui era dela. Ela vendeu. E ainda ontem a Baronesa de Peruíbe andava aí mostrando a uma turca rica que quer comprar o banco inteiro. É a crise.

No 2º cemitério a gente pode ver dos carneiros suntuosos aos restos monumentais da pequena burguesia e no fundo, lá bem no fundo depois da gente andar bastante, o campo estéril maltratado, desconhecido dos mortos que não têm nome.

Na rua o português amarra flores e limpa cactos. Uma mulher de perto chorosa lhe compra sem olhar dálias amarelas.

-Eu compreendo… A senhora é uma senhora de sentimento. Mas tenha paciência… Eu compreendo o seu sentimento. Como a senhora poucas há…

Guarda os vinte mil réis.

-É como os outros. No primeiro mês compra e não olha preço nem flor… No segundo pechincha e no terceiro coisa nenhuma.

No portão aparece a alegre festa fúnebre de um enterro proletário barulhento. O táxi com 16 pessoas amontoadas mostrando a mocidade que come bananas e festeja materialmente o afastamento daquele parente e amigo que costumava ver.

De outro lado, no portão nobre, o côche senhorial e triste de um enterro de luxo.

Quanto maior a riqueza, maior a seriedade.